Era sua última flha do caderno. Se não conseguisse exprimir tudo o que sentia naquelas pautas, nunca mais teria outra oportnidade. O grafite quebrava a toda hora, tamanha era a força de seus movimentos. Aquilo nunca lhe acontecia.
Escritor desde os 22 anos, ele agora com 47 parecia ter esquecido como era escrever. Tentou lembrar-se de clichês, de Shakespeare ou de qualquer filme bobo para garotas. Não. Suas idéias não vinham. Ele realmente estava diferente.
Quando se apaixonou, dessa vez por uma ninfeta de 18 anos, não tinha imaginado que seria tão difícil mantê-la sob seus braços.
Olhou para seus músculos. Talvez fossem o motivo dela. Já não eramais garoto e, apesar de ter mantido a vaidade por todos esses anos, sabia: não era páreo para as novas concorrências. Ela estava traindo-o. Estava convicto, certo, de suas especulações.
Tomado por um ciúmes incontrolável, ele fez um papel ridículo logo no primeiro churrasco da faculdade de engenharia, à qual ela havia recém ingressado. Aquele monte de jovens bêbados tentava se aproximar de sua morena como cachorro atrás de frango. No som, tocava um desses "proibidões" do funk e todos rebolavam até o chão como se fosse uma dança de acasalamento. Puxou-a com raiva de dentro da roda e ouvi-se um coro confuso de indignação. Morena, mais bêbada do que ele jamais havia visto, nem se dava conta do assédio.
- O que você tá fazendo, Morena?
- Me larga! VocÊ tá me machucando!
Uma discussão calorosa tomou conta da festa. Barraco digno de novela das oito com a Suzana Vieira. O vermelho tomava os rostos dos dois enquanto a obsessão extravasava da razão. Ele só parou de gritar com ela quando ouviu um qualquer:
- Ô, tio! Não precisa gritar assim. Tá todo mundo se comportando aqui!
Mal ouviu a interrupção e já saiu voando pra cima do garoto. Nem percebeu que morena tentava intervir.
Pow. O nariz de morena sangrava. Suor e sangue numa pintura poética de um desastre que ele nem tivera tempo para prever.
O mais forte da trupe ameaçou revidar, mas foi segurado por outros. O "tio" saiu dali ainda ouvindo o choro de morena. Sem ter aonde ir, no entanto, sentou-se do outro lado da rua, na calçada, à espera de poder ao menos pronunciar um pedido de desculpas. Envergonhado, nem o havia feito.
Foram os 5 minutos mais longos de sua vida. Morena desceu acompanhada por um casal e não lhe dirigiu nada além de um olhar de fúria e reprovação. Ela também se sentia humilhada.
Dias depois, quando tentava se redimir e após gastar 97 folhas do "caderno pautado - uma matéria - 98 folhas brancas" em vão, entendeu. Com a mão ainda inchada pelo incidente, sabia que não haveura mais volta. Ela também deveria estar inchada. Rasgou a última folha em branco e enfiou a mão num balde de gelo.
quinta-feira, 5 de março de 2009
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