Ele me perguntou quando.
Eu apenas respondi que não tínhamos tempo.
- Cada minuto é precioso, meu bem.
Me pareceu um pouco ansioso, mas nada que umas boas doses não curassem.
Chegando ao aeroporto, eu já nem sabia mais para onde estava indo. Apenas queria decolar e sentir que o frio na barriga não tinha vindo do meu coração.
Comprei uns chicletes na loja do saguão. De entupido, bastava o intestino.
- Última chamada para o vôo 1937 com destino a...
Era esse o vôo que eu ia pegar. Nem bem a voz metálica terminou anunciação e eu começava a sentir o arrependimento consumir meu cérebro aos poucos. Às vezes, muitas, desconfio da genialidade da razão.
Acendi um incenso na fila de embarque e enquanto ainda esperava o fogo cessar e o cheiro me acalmar, uma mão tocou meu ombro.
- Oi - uma voz masculino pronunciou.
Gelei. Será que é ele?
Virei furtivamente. Na verdade, tremia tanto que, à vingança da minha razão, minhas pernas se mexeram sem a minha ordem.
- A Sra vai ter que apagar seu incenso. Aqui é proibido.
Até pensei em argumentar que a proibição é ao cigarro e não à minha inocente fumaça - que, aliás, era bem melhor do que o acre odor de um dos senhores à minha frente.
Mas eu não estava em codição para argumentar.
Poderia acabar desabando em um choro profundo.
OK. Enfiei o incenso num gole da coca sem gás que eu segurava há horas só para manter minhas mãos ocupadas. Tsss.
Inspirei o máximo da fumaça que ainda subia pela garrafa.
Minha poltrona era a da saída de emergência. Uma alegria que eu teria aquele dia seria o prazer de viajar com as pernas esticadas.
Antes de desligar meu celular e outras bugigangas tecnológicas, ouvi o barulhinho:
- Plim!
A mensagem era dele.
"Quantos minutos ainda temos juntos?"
Foi só o tempo de pensar na resposta e lá veio a comissária de bordo:
- A Sra vai ter que desligar seu celular. Aqui é proibido.
Ela estava certa. Ele ficaria sem a minha resposta.
O avião decolava.
Horas de vôo após, acordei com a luz do sol. Provavelmente já estávamos algumas horas para trás.
Levantei e fui ao banheiro. Um pouco de água no rosto para recuperar a consciência.
Ao sair dali, no entanto, olhando ao redor, constatei que estava sozinha no boeing.
Quantas vodkas eu havia tomado aquele dia?
Hum... Mas não bebo vodka...
Perguntei à aeromoça:
- Que horas são?
- Em qual fuso horário?
- Não entendi... Eu embarquei em um vôo doméstico...
Ela apenas riu e saiu pelo avião. Acho que não sabe o que é uma piada de verdade...
Segui-a com o olhar e me aliviei. Eu ainda não havia enlouquecido. Outras passageiros, poucos, espalhavam-se pelo avião.
- Srs passageiros. Estamos pousando no aeroporto de...
- Repete!! Capitão!! Não entendi! - minha voz não saía.
Em solo. Desconhecido. Já posso afrouxar meu cinto?
Esteira, esteira, esteira, esteira...
Mala no carrinho. Fui guiando até a saída.
Ele estava lá.
Meu deus!
Ele estava lá!!
Euforica, gritei seu nome.
Repetidas vezes!
Mas ele não me ouviu. Onde tinha ido parar a minha voz?
Gritei o mais alto que pude. Tão alto que gases saíram por onde não deviam àquela hora.
Ele nem titubeou. Percebi que embarcava no vôo contrário.
E foi então que olhei para o relógio central.
Eu havia voltado cinco meses no tempo. Olhei ao redor e ele já não estava mais lá.
Havia sido tudo uma ilusão. Mas eu... Não acordara a tempo.
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"Gritei o mais alto que pude. Tão alto que gases saíram por onde não deviam àquela hora."
ResponderExcluirPô Samara, ai é foda...